O Tempo da Inocência

Minhas lembranças são de um tempo muito feliz de minha vida, que posso intitulá-lo “o tempo da inocência”. Eu era mais uma criança na minha cidade natal de Campos dos Goytacazes. Naquela época – anos 70 – o Brasil passava por uma transformação político-social na qual a ditadura e a censura imperavam e isso influenciava muito na educação das crianças e nas cidades do interior muito mais ainda. Eu vivia como a maioria das crianças no ceio familiar. Era a minha mãe quem gerava os recursos para que pudesse nos criar. Ela era separada do meu pai e enquanto trabalhava, meu irmão menor e eu ficávamos, cada um, na casa de uma de nossas tias – irmãs de nosso pai.
Tia Laerta

A minha tia Laerta era casada com um filho de italiano e a 
minha convivência naquela casa, para mim, foi de um valor inestimável. Eu era muito feliz com tão pouco. Bastava o carinho e a atenção da minha tia e dos meus primos que cuidavam de mim enquanto a minha mãe trabalhava.
De vez em quando o meu pai nos visitava e eu recordo a felicidade da minha tia com a sua chegada. Imagino que ela sabia que aqueles poucos instantes da sua presença nos trazia uma grande alegria e que isso era muito bom para a nossa criação.
Eu adorava ficar na horta. Eu tocava a bomba que enchia o reservatório de água para que meus primos regassem os canteiros de verduras que eles cultivavam com tanto esmero e carinho. Aquilo para mim era como se fosse um brinquedo. Eu adorava todo aquele movimento que me envolvia enquanto eu tocava aquela bomba d’água manual, que aos poucos, abastecia um grande tanque redondo. Depois eu saia correndo entre os canteiros daquela horta imensa onde eu passava grande parte dos meus dias. Grande parte da nossa alimentação vinha daquela horta maravilhosa.
É uma saudade boa que eu sinto daquele tempo, pois, apesar da minha timidez cultivei algumas amizades que, também, foram de muita importância na minha formação como pessoa.
Nossa escola era longe de casa e nós caminhávamos bastante para chegar. Na escola, o meu convívio era de muita dedicação. Eu adorava as aulas de português e de música. Aliás, a música sempre foi uma coisa marcante em minha vida. Eu assistia com muita atenção às aulas da Dona Ziza. Creio que minha aptidão para a música tenha surgido através da sua intervenção. Ela era muito exigente com todos nós, mas, todos, gostávamos muito das suas aulas. Sempre me lembro dela e como isso é bom.
Enquanto voltávamos para as casas de nossas tias, eu e meu irmão Roberto, caminhávamos, comentando sobre tudo que acontecia no nosso dia na escola. Assim o tempo passava e nem percebíamos. E ao chegar em casa a recepção sempre era calorosa. Eu era o mimo da casa. As atenções eram todas voltadas para mim a ponto de eu me sentir filho dos meus tios e irmão dos meus primos. Eu tratava a minha tia de mãe e minha própria mãe pelo nome, mas tudo era muito natural e sem traumas.
Minha vida não teria o mesmo valor e eu não seria uma pessoa feliz, se não tivesse esse passado tão rico. Uma riqueza de ternura e de amor que me foi presenteada por pessoas de uma simplicidade invejável.
Tia Laerta será para sempre em minha vida uma referência de ser humano e estará sempre acomodada em seu espaço cativo no lado esquerdo do meu peito e na minha memória de filho grato.


Luiz Malvino
14out2011

7 comentários:

Myrian disse...

Texto muito rico e lindo!
Serve para mostrar que mais do que qualquer coisa material, a criança precisa de atenção e afeto.
Seria tão bom se todas as famílias agissem como a Tia Laerta.
Sua maneira de ser, tranquila e equilibrada, o bom pai que você é, o avô enternecido que já é também, tudo é fruto dessa infância feliz.
É o tesouro que você tem e nada poderá tirá-lo de você.
Beijo carinhoso.

Anônimo disse...

Quanta sensibilidade e sabedoria vc tem para escrever! Isso e um dom para poucos, e vc e muito inteligente tambem. Um beijo carinhoso da sua amiga da serra Lilica.

jeito simples disse...

A tia Laerta, como você mesmo diz, era uma santa e todo o amor que ela te dedicou resultou neste homem ímpar que és. Que benção você ter tido uma tia como ela, que cuidou da sua formação de caráter e que benção para mim por viver a seu lado e poder desfrutar de toda esta riqueza que é você meu amor...

Maria Cininha disse...

Prometi a mim mesma que hoje passaria por aqui.Porque a tempos estou devendo. E veja que encontro este lindo texto. Você me fez lembrar também de um monte de coisas da minha infância. Da escola longe de casa e ter que andar muito para chegar até ela, da minha professora, querida, que me acompanhou por todo o primário, da horta de casa e dos canteiros de flores. Não tive uma tia assim tão especial, mas tive uma avó inesquecível, e você me fez também lembrar dela. Você só poderia ser marido da Norma.
Obrigado por seus comentários e poesias e tudo mais sobre o meu trabalho. Vou ter que trazer um lenço quando vier aqui.

Beijos

Martiacininha

Unknown disse...

Obrigado por tantas palavras carinhosas de vocês.
Não tenho tido muito tempo para postar, por conta do meu trabalho, que tem me absorvido nestes dias. Porém, assim que as minhas atribuições voltarem ao normal, retomarei - com mais assiduidade - minhas postagens neste espaço que me dá tanta alegria.
Beijos para vocês!

chica disse...

Lindo carinho pra tia Laerta , de quem tens tantas boas e belas lembranças...
Um abração,obrigado pelo carinho e tudo de bom,chica

Myrian disse...

Querido amigo,
Muito obrigada por suas doces palavras no meu cantinho.
Beijo e até breve.
Saudade.